O passado em mim

 
Pouco antes das onze horas da noite, minha cabeça pesou sobre o travesseiro.
A cama, com cheiro do passado, transportou-me há mais ou menos 50 anos onde tudo aconteceu.
Eu era uma menina feliz, contagiante. Abria a janela e olhava a vida, achava-a interessante. Meus pais nem preocupavam-se com o que o futuro prepara àquela menina dócil e de alma ingênua.
Acreditavam que era esperta demais para ser enganada pela vida.
Mais tarde, com meus 16 anos, coração em flor, pus inquietações nos 17 anos do mancebo Eurico, rapaz humilde e farto de amor pra dar.
Apesar das curtas palavras, os nossos beijos afogavam -  se no amor...
Nossa história assim Deus escrevia, um amor que nascera feito rio, não sabíamos onde findava, reconhecíamos que havia nascente; e esta conservava-se dentro de nós.
O coração saltava; Eurico engasgou as emoções contidas na garganta. Foi quando mais calmo disparou:
- Queres ser minha para sempre?
Isentamos, como de costume, as palavras e nos entendemos pelo beijo sincero e doce. que compunha desde o princípio nosso amor.
Ah... os beijos do meu amado! Jamais coubera em mim tamanha ternura e tão irresistível paladar.
Finalmente, a virgem, intacta de alma, de agora em diante usaria aliança no dedo e teria um homem pra cuidar.
Lavava. Cosia. Passava as roupas de Eurico, exceto no nono mês, quando dei à luz um menino, que a morte fez questão de ser a primeira a embalar ainda em parto. Bebi em cálices fundos as lágrimas da minha dor; por sorte, Eurico aliviava a ferida.
Infelizmente, a ingratidão não parou por ai: meu querido esposo, foi levado de meus braços enquanto fazíamos amor. Num segundo seus lábios pararam nos meus e gelaram.
Sentia - me violentada pela morte, frustrada pelo destino. Vazia.
Num ímpeto fui beijada pelo amanhacer, e o mesmo trouxe-me de volta a esta cama, à esse quarto.
Fechei a janela e ofusquei a luz do solque insistia em fazer o ambiente sorrir, Repousei o meu passado em cada canto da vida e da morte e espalhei na alma a saudade de um passado que vive em mim.


Carla Gomes

1 comentários:

Anônimo 2 de setembro de 2010 às 09:48  
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"Coração é terra que ninguém anda", já dizia minha vó, e continua sendo assim na era do GPS. O órgão vital que pulsa e controla nossas emoções, deleta as razões quando se trata de amar!

O blog foi pensado com objetivo de despertar o que a maioria tenta esconder O SENTIMENTO, amor, ódio, tristeza, alegria todas as sensações que são latentes em nosso interior e constitui nossas ações. O seu coração precisa de umas horas diárias de poemas, poesias que inspirem seu dia e o torne alguém forte e renovado.

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